quarta-feira, 2 de junho de 2010

O NOVO ACORDO ORTOGRÁFICO


A ortografia do português de Portugal vai mudar. Esse é um dado adquirido e só um distraído profundo não percebe que, no quadro da emergência do Brasil como potência económica e política, é importante que Portugal reforce os laços. O novo acordo ortográfico é uma peça nesse reforço. É, portanto, racional querer uma base de entendimento para as diferentes comunidades falantes de português.
Atualmente, mais de 200 milhões de pessoas falam português em todo o mundo e, porque o Português é língua oficial em oito Estados soberanos com duas ortografias, ambas correctas, a de Portugal e a do Brasil, urge alterar a ortografia no sentido de a unificar, utilizando a fonética apenas como um dos instrumentos dessa unificação ortográfica. Efetivamente, no que diz respeito à língua escrita, deverá existir alguma disciplina para que língua não se transforme em dialectos regionais.
Urge, contudo salientar, que subida das línguas ibéricas -- o eixo ibero-americano está a ganhar importância crescente em termos tanto regionais (UE, América do Sul) como globais. Neste quadro, a existência de um acordo ortográfico é um instrumento de defesa do português. É racional cuidar da língua.Há razões pessoais, também. Eu quero entender-me melhor com os brasileiros. Partilho com muitos brasileiros um número crescente de interesses, graças às redes sociais e à Internet. Presumo que o mesmo se passa com milhões de portugueses e brasileiros. Um acordo para a ortografia é um passo para a melhoria desse entendimento. Chame-me presunçoso.o acordo ortográfico é apenas um acordo, não é uma imposição ou obrigação, ao contrário do que parecem temer os resistentes. Não ameaça as diferenças na utilização da língua, mas é um instrumento para melhorar a comunicação entre culturas diferentes a muitos níveis. Poderíamos perguntar quais são os argumentos contra o acordo e aí, provavelmente apontar-se-iam as diferenças geo-culturais que implicarão, sempre, diferenças linguísticas. Porém, se refletirmos bem, não teremos mais dificuldade com alguns dos regionalismos portugueses do que com os brasileiros?
Então, o que irá, de facto, mudar?
A maior alteração na ortografia da língua portuguesa, na variante lusoafricana é a supressão das consoantes mudas ou não articuladas que não se pronunciam, tal como já acontece na variante brasileira. Vejamos: ‘acção’ perde o c uma vez que este não é articulado e passará a escrever-se ação. O mesmo se passa com ‘diretor’, ‘ata’, ‘adoção’. Contudo, a palavra ‘facto’ continua a escrever-se da mesma maneira, pois o c é articulado na variante luso-africana. Em síntese, nos casos em que as letras c e p são proferidas nas pronúncias cultas da língua, aquelas não desaparecem. Exemplifiquemos: ‘adepto’, ‘apto’, ‘compacto’, ‘convicção’, ‘erupção’, ‘eucalipto’, ‘ficção’, ‘egípcio’, ‘pacto’, ‘núpcias’, ‘rapto’.
Contudo, nas palavras ‘adotar’, ‘ato’, ‘afetivo’, ‘batizar, ‘coleção’, ‘coletivo’, ‘Egito’, ‘exato’, ‘ótimo’ o ‘c’ e o ‘p’ eliminam-se, pois são letras ‘mudas’ nas pronúncias cultas da língua.
Deste modo, impõe-se clarificar que o acordo ortográfico não altera a pronúncia de qualquer palavra, apenas muda a grafia, ou seja, a maneira como se escrevem. Além disso, não cria nem elimina palavras, pois não tem nada a ver com as variações de uso ou de significado, mas sim com a maneira como se escrevem. Como o acordo ortográfico só trata de pronúncias cultas da língua, não elimina em nenhuma palavra qualquer letra que se leia nem estabelece regras de sintaxe.
Uma outra questão importante prende-se com o facto de o acordo ortográfico não interferir com a coexistência ou com as regras de normas linguísticas regionais, pois, como toda a gente sabe, a língua portuguesa é falada em mais de um país e de um continente, tendo variantes que podem ter normas próprias, que, nalguns aspetos, poderão estabelecer regras diferentes ou mesmo contrárias.
Em conclusão, o acordo ortográfico não introduz uma completa uniformização na grafia das palavras. Pretende-se, sim, a redução ao mínimo possível das diferenças existentes. Com o acordo ortográfico escreveremos as palavras nos países de língua portuguesa em harmonia com uma única norma.

Lúcia Vaz Pedro

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